Amor Algébrico
de Euclides da Cunha
Acabo de estudar – da ciência fria e vã,
O gelo, o gelo atroz me gela ainda a mente,
Acabo de arrancar a fronte minha ardente
Das páginas cruéis de um livro de Bertrand.
O gelo, o gelo atroz me gela ainda a mente,
Acabo de arrancar a fronte minha ardente
Das páginas cruéis de um livro de Bertrand.
Bem triste e bem cruel decerto foi o ente
Que este Saara atroz – sem aura, sem manhã,
A Álgebra criou – a mente, a alma mais sã
Nela vacila e cai, sem um sonho virente.
Que este Saara atroz – sem aura, sem manhã,
A Álgebra criou – a mente, a alma mais sã
Nela vacila e cai, sem um sonho virente.
Acabo de estudar e pálido, cansado,
Dumas dez equações os véus hei arrancado,
Estou cheio de spleen, cheio de tédio e giz.
Dumas dez equações os véus hei arrancado,
Estou cheio de spleen, cheio de tédio e giz.
É tempo, é tempo pois de, trêmulo e amoroso,
Ir dela descansar no seio venturoso
E achar do seu olhar o luminoso X.
Ir dela descansar no seio venturoso
E achar do seu olhar o luminoso X.
Rimas
de Euclides da Cunha
Ontem – quando, soberba, escarnecias
Dessa minha paixão – louca – suprema
E no teu lábio, essa rósea algema,
A minha vida – gélida – prendias…
Eu meditava em loucas utopias,
Tentava resolver grave problema…
Como engastar tua alma num poema?
E eu não chorava quando tu te rias…
Hoje, que vivo desse amor ansioso
E és minha – és minha, extraordinária sorte,
Hoje eu sou triste sendo tão ditoso!
E tremo e choro – pressentindo – forte,
Vibrar, dentro em meu peito, fervoroso,
Esse excesso de vida – que é a morte…
Página Vazia
de Euclides da Cunha
Quem volta da região assustadora
De onde eu venho, revendo, inda na mente,
Muitas cenas do drama comovente
De guerra despiedada e aterradora,
De onde eu venho, revendo, inda na mente,
Muitas cenas do drama comovente
De guerra despiedada e aterradora,
Certo não pode ter uma sonora
Estrofe ou canto ou ditirambo ardente
Que possa figurar dignamente
Em vosso álbum gentil, minha senhora.
Estrofe ou canto ou ditirambo ardente
Que possa figurar dignamente
Em vosso álbum gentil, minha senhora.
E quando, com fidalga gentileza
Cedestes-me esta página, a nobreza
De nossa alma iludiu-vos, não previstes
Cedestes-me esta página, a nobreza
De nossa alma iludiu-vos, não previstes
Que quem mais tarde, nesta folha lesse,
Perguntaria: “Que autor é esse
De uns versos tão mal feitos e tão tristes?”
Perguntaria: “Que autor é esse
De uns versos tão mal feitos e tão tristes?”
A Flor do Cárcere
de Euclides da Cunha
Nascera ali – no limo viridente
Dos muros da prisão – como uma esmola
Da natureza a um coração que estiola -
Aquela flor imaculada e olente…
Dos muros da prisão – como uma esmola
Da natureza a um coração que estiola -
Aquela flor imaculada e olente…
E ele que fôra um bruto, e vil descrente,
Quanta vez, numa prece, ungido, cola
O lábio seco, na úmida corola
Daquela flor alvíssima e silente!…
Quanta vez, numa prece, ungido, cola
O lábio seco, na úmida corola
Daquela flor alvíssima e silente!…
E ele – que sofre e para a dor existe -
Quantas vezes no peito o pranto estanca!..
Quantas vezes na veia a febre acalma,
Quantas vezes no peito o pranto estanca!..
Quantas vezes na veia a febre acalma,
Fitando aquela flor tão pura e triste!…
- Aquela estrela perfumada e branca,
Que cintila na noite de sua alma…
- Aquela estrela perfumada e branca,
Que cintila na noite de sua alma…
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